domingo, 16 de setembro de 2012

quinze do nove

Cheguei à Praça. Vim num metro a abarrotar de gente como nem em Paris à hora de ponta tinha visto. A linha de Sintra saiu comigo do sofá e veio até Lisboa em peso, de comboio. Muitos deles acompanharam-me desde Queluz até à Praça do Povo, como alguns já lhe chamam. O legado operário sente-se no ar, o nome do socialista José Fontana ouve-se nas conversas entre pais, filhos, netos, avós, activistas, estudantes, metaleiros e trabalhadores. Sinto que hoje é um dia de mudança.

A marcha já tinha começado quando eu cheguei: eram 17h10m, vinte minutos antes da hora marcada para o início da manifestação. Isto nunca acontece. Mas aconteceu ontem. Já tinha acontecido em Maio de 1974, disse um repórter que teve a sorte de presenciar o primeiro Dia do Trabalhador da democracia portuguesa.

Íamos ainda na praça do Saldanha quando pessoas começam a receber telefonemas de amigos que já tinham chegado à Praça de Espanha. «Nem os repórteres nem a polícia conseguem delimitar o princípio e o fim da manifestação. Anda tudo a fazer previsões, mas o que se passa hoje em Lisboa nem no 11 de Março do ano passado. Nunca vi tanta gente junta». É verdade: as ruas que estão cortadas ao trânsito são mais do que as previstas, porque o fluxo de pessoas é tão grande que os carros são forçados a parar durante minutos seguidos para deixar passar os manifestantes, que continuam a chegar.

A única coisa que me saiu da garganta foi «Isto está bem composto». Quando chego a casa e leio em vários sítios que nunca desde o fim da ditadura se viu uma tão grande e heterogénea mobilização popular, rio-me do meu eufemismo. Isto foi provavelmente a maior demonstração de poder popular a que já assisti desde que nasci. E algo me diz que não será a última.

Foi um despertar colectivo. Foi mais do que um grito de indignação, foi uma ordem. Foi um comando, foi uma moção de censura popular. Não foram muitas as vozes que encheram as praças e as ruas do país ontem, não, não podemos deixar que nos digam que foram muitos os pés que encheram as avenidas e as estradas portuguesas. Não foram muitas, foi apenas uma voz. E é por isso que ontem abrimos todos em conjunto as portas a um novo ciclo na história da participação cívica portuguesa. Ontem vimos o nosso poder, e fizemos ver. Ontem aprendemos e ensinámos. Aprendemos como a diversidade é capaz de nos unir na semelhança e na diferença. Ensinámos como é isto mesmo que eles devem temer. Acabou o tempo de ouvir, chegou o tempo de sermos ouvidos. Acabou o tempo de sermos governados, chegou o tempo de governarmos. Pegaremos nas rédeas e reconquistaremos as nossas vidas.

«15 de Setembro sempre, Troika nunca mais»